A crise deflagrada no Movimento Brasil Livre (MBL) com o vazamento de áudios sexistas de um de seus principais líderes, o deputado estadual Arthur do Val (Podemos-SP), levou o grupo de manifestações, que se fortaleceu politicamente na campanha de 2018, a enfrentar um grave prejuízo na sua imagem pública. Porém, de forma distinta, outros movimentos com perfil de renovação ou formação de políticos, que também impulsionaram a renovação do Congresso há quatro anos, igualmente tentam contornar desgastes, como rachas internos e entraves à sua atuação no modelo partidário.
Grupos como o Acredito, RenovaBR, Livres e Raps já trabalham para se reposicionar nesta eleição. Ao todo, esse conjunto ajudou a eleger 24 deputados federais e senadores, 80% para o primeiro mandato.
Do Val, conhecido como “Mamãe Falei”, era tido como peça-chave para o avanço do MBL com sua pré-candidatura ao governo de São Paulo, retirada após o amplo repúdio causado por suas falas sobre mulheres da Ucrânia. O episódio levou o presidenciável Sergio Moro (Podemos) a romper com Do Val, o que deve empurrar o MBL para sua primeira eleição apartado do bolsonarismo e do lavajatismo, dois de seus principais pilares em campanhas anteriores.
O grupo já havia rompido com o presidente Jair Bolsonaro em 2019, quando se recusou a endossar atos de rua pró-governo, e viveu um processo paralelo de desidratação em seu núcleo fundador. Após 2018, antes de o MBL tornar-se persona non grata para o bolsonarismo, coordenadores e lideranças se desligaram do movimento alegando não concordar com expedientes como fake news para ataques a adversários, principalmente à esquerda. Em 2021, o vereador de São Paulo Fernando Holiday (Novo-SP) também deixou o grupo, sob o pretexto de se dedicar a pautas que não faariam parte da agenda do MBL, como a causa LGBT.
Perda de espaço
Desde o rompimento com o Planalto, o MBL perdeu terreno no campo da direita, de acordo com especialistas, e viu episódios controversos envolvendo seus membros se tornarem palco para ataques de bolsonaristas. Há um mês, o deputado Kim Kataguiri (DEM-SP) tornou-se alvo de representação de Eduardo Bolsonaro (PL-SP) no Conselho de Ética da Câmara após declarar que a Alemanha teria errado ao criminalizar o partido nazista.
No caso mais recente, envolvendo Do Val, levantamento da Arquimedes a pedido do GLOBO mostrou que perfis bolsonaristas dominaram cerca de 40% do debate no Twitter sobre repúdio ao conteúdo dos áudios vazados. A hashtag #MamaeFaleiCassado, que chegou a mais de 27 mil publicações e foi a de maior destaque sobre o tema, partiu de um perfil incluído na rede bolsonarista.
“Os bolsonaristas fecharam o espaço do MBL no campo da direita. Isso aconteceu com vários movimentos, sobretudo os que apoiaram Bolsonaro em 2018, que perderam a disputa de narrativas no campo dos “antissistema” e tampouco conseguiram apresentar resultados práticos com seus parlamentares, por uma dificuldade de coordenação”, afirmou Pedro Bruzzi, diretor da Arquimedes, que atua com análise do debate nas redes sociais.
Também apartado do bolsonarismo, o Vem Pra Rua declarou apoio a Moro e, para recuperar terreno, pretende espalhar candidatos ao Legislativo por partidos. Segundo a porta-voz Luciana Alberto, a ideia é exigir das siglas compromissos de apoio a pautas como fim do foro privilegiado e prisão na segunda instância.
“Houve uma renovação em 2018 por quantidade, mas não com a qualidade desejada. Muitas pautas foram engavetadas ou tiveram retrocessos apoiados pelo governo. Com certeza vamos querer cartas dos partidos para assegurar autonomia aos parlamentares nessas pautas”, afirmou Luciana Alberto.
Tensão interna
Já o Acredito, ainda trabalha para definir as diretrizes para a eleição deste ano enquanto tenta estancar problemas internos. O posicionamento recente de Rigoni, hoje filiado ao União Brasil, a favor de projeto para novas regras de registro de agrotóxicos, apelidado de “PL do Veneno”, irritou lideranças locais do movimento, que ameaçaram uma debandada.
Outros grupos, como Livres e RenovaBR, que tiveram representantes espalhados por siglas de diferentes campos ideológicos na Câmara, hoje trabalham para lançar uma nova leva de candidatos, mas sem o objetivo de organizá-los para atuar de forma conjunta. O cientista político Magno Karl, uma das lideranças do Livres, afirmou que o diálogo do movimento com os partidos melhorou desde 2018, quando seu grupo foi desalojado do PSL para a entrada do então deputado Jair Bolsonaro e seus aliados. Até então, o objetivo era que o PSL servisse de “incubadora” para candidatos do Livres, uma ideia que não será reeditada pelo movimento em 2022.
“Vamos notando com o passar do tempo que as pessoas mudam. Claro que não esperamos um alinhamento de 100% conosco, mas também não pode haver um desalinhamento muito grande para manter o “certificado” de candidato do Livres. Mesmo assim, se a pessoa tem sua estratégia de mandato, deixamos claro que a gente não interfere. Os partidos entenderam que não vamos ficar policiando eles, que o compromisso é dos indivíduos com o Livres”, afirmou Karl.
A Raps, por sua vez, que não se define como movimento de renovação, já que abre seus cursos para parlamentares com mandato, planeja aprofundar o acompanhamento que já faz com seus representantes no pós-eleição. Segundo a diretora-executiva da Raps, Mônica Sodré, o objetivo é tanto articular debates e fornecer material técnico para balizar a análise de projetos que entrarem em tramitação no Congresso, quanto gerar um “banco de talentos” com voluntários das campanhas que possam depois ser absorvidos como assessores e funcionários dos gabinetes. O “programa de lideranças públicas” da Raps tem 80 integrantes neste ano, e boa parte deve se candidatar ao Legislativo.
Com informações do O Globo
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