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Esporte enquanto política de inclusão na perspectiva socialista

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O objetivo deste texto é mostrar, do ponto de vista concreto, que no socialismo brasileiro criativo, exequível e factível, como o proposto pelo PSB, a partir das teses da Autorreforma, deve caber ao estado um papel importante e decisivo para o necessário tratamento da política de esporte, lazer e entretenimento. Os benefícios em termos de saúde, economia e de consciência social fazem do esporte um elemento estratégico na construção de uma pátria livre e verdadeiramente soberana.

Tornar o Brasil uma potência esportiva será consequência das decisões corretas para a valorização dessa prática enquanto política pública de estado.

O conceito de esporte sofreu nos últimos trinta anos modificações em todo o mundo, que passaram a definir a importância desse setor não só como atividade de lazer, competição ou entretenimento. Mas como, principalmente, uma atividade econômica, importante para a inclusão social e para redução de problemas ligados à saúde, à sua prevenção e, também, ligados à educação. Esse “novo”, por assim dizer, entendimento requer, ainda mais, a participação do Estado, a meu ver.

Assim, a prática esportiva exige uma política de Estado, uma política pública que possa ordenar, orientar e fomentar tal prática, democratizando seu acesso e envolvendo sua população no entendimento e no hábito de se praticar atividades físicas de forma regular.

A história da ação do Estado em relação ao esporte no Brasil começou muito antes da criação da primeira legislação esportiva e do Conselho Nacional de Desportos (CND). O Estado brasileiro, notadamente a partir dos militares, então no poder, já intervinha nas organizações esportivas de prática (clubes, times), de administração (federações e confederação), e nas competições organizadas no país.

O Decreto Lei Nº 3.199 de 1941 foi a primeira legislação esportiva oficial do Brasil, estabelecendo as bases de organização dos desportos em todo país ao definir, em seu artigo 1º, que o “Conselho Nacional de Desportos (CND) tem a obrigação de orientar, fiscalizar e incentivar a prática dos desportos em todo país”. Para esta orientação ou fiscalização do CND, o então decreto de lei colocou as confederações, federações, ligas e associações desportivas sob a tutela do CND, assim como também os desportos universitários e os da Juventude, bem como os da Marinha, do Exército e os das forças policiais.

Essa legislação era uma adaptação bastante próxima da legislação fascista italiana para o esporte, visto que todos os níveis do desporto brasileiro se encontravam sob a chancela de um órgão maior que era o CND, regido pelo governo da época. Durante décadas, o Estado no Brasil reservou timidamente ao esporte departamentos e secretarias dentro de ministérios já consolidados.

Em 1975 uma outra lei institui normas gerais sobre desportos. Um fato a destacar nesta lei é a Política Nacional de Educação Física e Desporto, como explicitado em seu parágrafo 5º, “O Poder Executivo definirá a Política Nacional de Educação Física e Desportos, com os seguintes objetivos básicos:

I – Aprimoramento da aptidão física da população; II – Elevação do nível dos desportos em todas as áreas; III – Implantação e intensificação da prática dos desportos de massa; IV – Elevação do nível técnico-desportivo das representações nacionais; V – Difusão dos desportos como forma de utilização do tempo de lazer.”

A partir desta lei, o Conselho Nacional de Desportos teve sua força ampliada, tornando-se os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário do esporte no Brasil. Em resumo, o CND passava a ter o poder absoluto sobre o setor. A legislação esportiva teve, entretanto, uma pequena modernização com esta lei, quando trata do Comitê Olímpico Brasileiro. Estabelece que o mesmo é uma associação civil constituída, de acordo com a lei e em conformidade com as disposições estatutárias e regulamentares do Comitê Olímpico Internacional, com independência e autonomia para organizar e dirigir, com a colaboração das confederações desportivas nacionais dirigentes do desporto amador, a participação do Brasil nos Jogos Olímpicos, Pan-Americanos e em outros de igual natureza, além de promover torneios de âmbito nacional e internacional; adotar as providências cabíveis para a organização e realização dos Jogos Olímpicos, Pan-Americanos e outros.

A partir de 1985, com a instauração da “Nova República”, houve um período de aparente ruptura do status quo que se estabeleceu na ordem jurídica esportiva nacional, abrindo-se novas oportunidades até então inibidas pela legislação anterior.

Na constituição de 1988 o esporte foi contemplado no artigo 217, numa visão atualizada e de grande alcance social: “É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não-formais, como direito de cada um, observados:

I – a autonomia das entidades desportivas dirigentes e associações, quanto a sua organização e funcionamento; II – a destinação de recursos públicos para a promoção prioritária do desporto educacional e, em casos específicos, para a do desporto de alto rendimento”.

E ficou definido que o Poder Público incentivaria o lazer como forma de promoção social.

Por sua vez, a Lei 8.672, de 1993, chamada de Lei Zico, institui normas gerais sobre o esporte brasileiro e abriu espaço para que a legislação versasse sobre a relação entre atletas e clubes. Deu, também, uma visão mais detalhada do desporto como atividade predominantemente física e intelectual, que pode ser reconhecida em qualquer das seguintes manifestações:

I – desporto educacional, através dos sistemas de ensino e formas assistemáticas de educação, evitando-se a seletividade, a hiper-competitividade; II – desporto de participação, de modo voluntário, compreendendo as modalidades desportivas praticadas com a finalidade de contribuir para a integração dos praticantes na plenitude da vida social, na promoção da saúde e da educação e na preservação do meio ambiente; III – o desporto de rendimento, praticado segundo normas e regras nacionais e internacionais, com a finalidade de obter resultados e integrar pessoas e comunidades do país e estas com outras nações.

O desporto de rendimento, ainda, segundo a lei citada, pode ser organizado e praticado:

I – de modo profissional, caracterizado por remuneração pactuada por contrato de trabalho ou demais formas contratuais pertinentes; II – de modo não profissional, compreendendo o desporto a) semiprofissional, expresso pela existência de incentivos materiais que não caracterizem remuneração derivada de contrato de trabalho; b) amador, identificado pela inexistência de qualquer forma de remuneração ou de incentivos materiais.

Essa lei fez com que a iniciativa privada assumisse boa parte das funções que eram do Estado. A redução drástica de participação do Estado no esporte, permitiu uma alteração no modelo esportivo brasileiro que era, no geral, mais próximo ao modelo soviético, aproximando-o da visão liberal predominante nos EUA.

A Lei Zico, sempre sobre tal perspectiva liberal, extinguiu o CND e criou o CSD, que tinha que constituir-se em mais uma agência de desenvolvimento do esporte, sem o caráter deliberativo como era o CND.

Entretanto, contraditoriamente, a Lei Zico esboça uma preocupação social na relação entre o homem e o mundo esportivo.

Um fato interessante que ocorreu no período entre a Lei Zico e a Lei Pelé, foram as várias discussões acerca da tentativa de os atletas conseguirem passe livre. Do ponto de vista mais geral, as duas leis não diferiram muito, sobretudo na parte inicial, que tratava dos conceitos, princípios e definições de referência.

Por sua vez, a Lei Pelé trouxe uma novidade cosmética em relação à lei Zico, que foi a legitimidade do Instituto Nacional do Desenvolvimento do Desporto (INDESP). O INDESP tinha como responsabilidade propor o Plano Nacional do Desporto e cumprir o Artigo 217 da Constituição Federal (BRASIL, 1988). A lei Pelé cria um Conselho de Desenvolvimento do Desporto que, em seu artigo 11, estabelece que este Conselho é um órgão colegiado de deliberação, neste sentido um avanço, e assessoramento, diretamente subordinado ao Gabinete do Ministro de Estado Extraordinário dos Esportes, cabendo-lhe zelar pela aplicação dos princípios e preceitos desta Lei.

Outra inovação da Lei Pelé foi a que abriu espaço para a autonomia das Ligas, respeitando assim a Constituição de 1988. Nesta Legislação são oferecidas garantias profissionais aos atletas quanto ao não cumprimento de obrigações trabalhistas, trata da liberdade do atleta profissional ao terminar o contrato, de ele assumir qualquer outra entidade esportiva, acabando assim o passe.

A Lei Pelé coloca restrições quanto à prática esportiva profissional. É vedada a participação em competições desportivas profissionais de atletas amadores de qualquer idade e de semiprofissionais com idade superior a vinte anos, assim como a prática do profissionalismo, em qualquer modalidade, quando se tratar de desporto educacional, seja nos estabelecimentos escolares de 1º e 2º graus ou superiores; desporto militar; menores até a idade de dezesseis anos depois.

A Lei Maguito Vilela, de julho de 2000, começa de certa forma realizando atualizações esportivas, pois cria o Ministério do Esporte e Turismo, acrescendo a ele a função de normatização ao Conselho de Desenvolvimento do Desporto Brasileiro (CDDB), dando mais força política ao Ministério e ao Conselho (BRASIL, 2000).

No artigo 27 da Lei, mais uma vez busca-se um tímido avanço. O autor da lei deixa claro que é facultativa a opção de a entidade de prática desportiva tornar-se empresa, o que pela Lei Pelé era obrigatória. Esta lei também deixa claro que o atleta tem que ter um maior profissionalismo, contudo não deixa explícita as obrigações das instituições empregadoras. Deixa claro também a extinção da impossibilidade da cobrança de taxas de transferência de atletas profissionais. No capítulo VII ocorre uma mudança considerável, aumentando para cinco o número de membros das comissões disciplinares, vinculando-as aos Tribunais de Justiça desportiva, e alterando também a correlação da representação do Superior Tribunal de Justiça Desportiva e dos Tribunais.

Em 2002, a Lei Piva abre grandes perspectivas para o esporte olímpico e paraolímpico, uma vez que, através de recursos permanentes, o COB e o CPB possam planejar os esportes de maneira mais própria e segura. Todavia, ainda se observam poucos recursos destinados aos esportes paraolímpicos, o que em futuras legislações, deve ser observado com mais atenção.

Com esta evolução histórica da legislação esportiva brasileira pôde-se perceber que o Decreto-Lei 3.191 (1941) e a Lei 6.251 (1975), estabeleceram períodos de completo poder do Estado em relação ao esporte. Poder autoritário, em que tudo era regido de acordo com os moldes governistas e ditatoriais. Contudo, a partir da Lei Zico iniciou-se uma mudança brusca na administração e regência do esporte nacional, conferindo uma autonomia às próprias instituições esportivas. Além disso, com a Lei Zico e a Lei Pelé, abriram-se novas esperanças e expectativas acerca da profissão ou profissionalismo dos desportistas e atletas brasileiros, isto sendo enfatizado com a Lei Maguito Vilela. Já com a Lei Piva foi dada uma maior autonomia para o Comitê Olímpico Brasileiro e Paralímpico.

Nos governos de Lula e Dilma, em que pese avanços administrativos importantes como a criação do Ministério do Esporte, algumas boas produções acadêmicas e a realização de três Conferências Nacionais (2004, 2006, 2010), pouco se fez no sentido de dotar o país de uma política esportiva perene.

Na verdade, o setor foi, como antes, digamos, “trabalhado” bastante sob a égide pragmática eleitoral. Embora tenha ocorrido neste período a realização de uma Copa do Mundo, um Pan Americano e uma Olimpíada, pouco ou quase nada ficou de legado em termos de política pública, financiamento e incentivo.

Este pragmatismo que não ousou enfrentar, por exemplo, o elitismo do sistema federativo, o corporativismo das entidades de educação física, e negligenciou a necessária fiscalização às entidades de esporte de alto rendimento como o COB.

O resultado foi que, com o desmonte e a extinção do ministério e de políticas públicas muito insuficientes, não houve nenhuma reação da comunidade esportiva brasileira no sentido de resistir minimamente à sanha do atual governo que foi e é, inclusive, apoiado por setores e personalidades importantes do setor.

Cabe às forças consequentes e socialistas resgatar sob os auspícios de uma legislação moderna, transparente e consequente, o que se deixou para trás que é a importante e necessária intervenção do estado, não para tutelar, mas para incentivar, fomentar, induzir e conduzir uma política que nos torne, de fato, uma potência esportiva e que, por consequência disso, sejamos também um pátria saudável e que dê uma alternativa a nossa juventude, hoje disputada pelo crime organizado ou não.

Afinal, é melhor investir recursos em equipamentos esportivos do que gastar dinheiro com prisões que, na prática, são verdadeiras universidades que formam, ou deformam, delinquentes.

JJ (Jairo Junior) é jornalista, sociólogo, produtor cultural e capoeirista



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