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Julgamento das sobras eleitorais no STF: vitória de Pirro

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Por: Leonardo Morais de Araújo Pinheiro, advogado administrativista e professor universitário.


Conta a história que Pirro, rei de Épiro, e primo de Alexandre – O Grande, é o autor de uma frase que dá conta dos custos decorrentes de um êxito militar acompanhado de imensas baixas, o que significaria uma vitória com ares de derrota: “Outra vitória como esta eestou perdido, retorno à Épiro sozinho”. No uso popular, a expressão “vitória de Pirro” ganha contornos semânticos de algo como “ganhar, mas não levar”. Assim pode ser compreendido o resultado do julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF) da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n. 7.263, que versa sobre a participação dos partidos políticos na distribuição das sobras eleitorais.

 

O cerne da ADI 7263 reside na aplicação da técnica de interpretação conforme à Constituição ao inciso III do artigo 109 do Código Eleitoral, objetivando garantir o pluralismo político, a igualdade de chances e a soberania popular e o sistema proporcional, a fim de permitir quetodas as legendas participassem da distribuição das sobras eleitorais.

 

O tema é de extrema sensibilidade, pois, identificou-se que a atual regra poderia acarretar uma ainda maior concentração de poder nas mãos de poucos partidos em pleitos proporcionais de entes da federação com menor densidade eleitoral, (ex. estados com 8 vagas na Câmara dos Deputados, e municípios com até 15 mil habitantes), que em uma situação extrema, porém não tão improvável, poderiam ter suas representações parlamentares compostas exclusivamente por um único partido político, já que é comum as agremiações partidárias não atingirem os 80% do quociente eleitoral.

 

Uma das consequências da decisão poderia ser a alteração imediata de 7 (sete) vagas na Câmara dos Deputados ocupadas por filiados a agremiações partidárias que, em sua maioria, integram a oposição, sendo: dois deputados do PL e um parlamentar do Republicanos, do Progressistas, do União Brasil, do MDB e do PDT. Por outro lado, ganhariam as cadeiras: PCdoB, PSOL, PSB ePodemos.

Após inúmeras suspensões por pedidos de vista, o STF concluiu na última quarta-feira, dia 28 de fevereiro de 2024, o aguardado julgamento da ADI 7263. O relator, Ministro Ricardo Lewandowski (aposentado), julgouparcialmente procedente a demanda, dando interpretação conforme à Constituição Federal, porém defendendo que seus efeitos haveriam de valer apenas para as eleições futuras, excluindo-se assim as eleições de 2022 do alcance da decisão. Entendimento acompanhado pela Ministra Carmem Lúcia.

 

Já os Ministros Alexandre de Moraes, atual presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e Gilmar Mendes (decano do STF), Flávio Dino, Dias Toffoli e Nunes Marques, embora tenham votado com o relator no mérito (interpretação conforme), divergiram deste quanto à modulação dos efeitos da decisão. Entenderam que os efeitos da declaração de inconstitucionalidade deveriam alcançar as eleições de 2022, promovendo-se a substituição dos 7 parlamentares.

 

Por outro lado, os Ministros André Mendonça, Edson Fachin, Luiz Fux e Luiz Roberto Barroso julgaram improcedente a ADI 7263.

 

Formou-se maioria pela interpretação conforme àconstituição de maneira a declarar a inconstitucionalidade da regra sobre as sobras eleitorais. Sem dúvida, uma vitória para o aprimoramento de eleições ainda mais livres e democráticas no Brasil, bem como, na espécie, para aqueles partidos que pleiteavam a substituição daquelas 7 vagas na Câmara dos Deputados.

 

Ocorre que, superada a discussão sobre a inconstitucionalidade, adveio um outro debate sobre aaplicação ou não do art. 16 da Constituição Federal (princípio da anualidade eleitoral), ou seja, se prevaleceria o mandamento constitucional de que as regras eleitorais não podem ser alteradas a menos de um ano do pleito eleitoral, afastando-se o efeitos da inconstitucionalidade declarada das eleições de 2022 e frustrando o ingresso daqueles deputados que acabaram de ter reconhecido no mesmo julgamento o seu direito de acesso ao mandato de deputado federal.

 

​Por 6 votos a 5, o STF entendeu pela aplicabilidade do art. 16 da Constituição no caso, promovendo na prática consequências equivalentes à modulação dos efeitos da decisão. Porém, não sem reiterados e contundentes avisos dos riscos do precedente aberto com a decisão, por parte dos Min. Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, que alertaram para as consequências deletérias ao sistema eleitoral por deixar parlamentares eleitos impossibilitados de assumirem os seus mandatos, mesmo tendo o STF reconhecido que alcançaram votos suficientes para tanto.

 

Pode-se até pensar que a “vitória de Pirro” se dá apenas em relação àqueles 7 deputados que ficaram de impossibilitados de assumir o seu mandato, se aplicarmos o uso popular dado à expressão: “ganhar, mas não levar”.Mas o ensinamento do rei de Épiro pode ser aplicadotambém de forma mais sistêmica, se levado em consideração o uso supostamente original da expressão, dando conta dos custos decorrentes da decisão para o sistema eleitoral e o precedente por ela aberto: “Outra vitória como esta e estou perdido, retorno à Épiro sozinho”.

 


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