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Mulheres na política: por que precisamos sempre relembrar o óbvio?

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Por: Olávio Gomes


Essa semana a balança de freios e contrapesos do presidencialismo de coalizão destacou o machismo estrutural que ainda se retroalimenta do discurso de democracia de gênero não aplicado à prática. Se há semanas meninas e mulheres ganhavam flores e recebiam mensagens de carinho e afeto, os jornais escancaram hoje o descaso com algumas e, principalmente elas, as mulheres em posição de destaque.

 

Ex-presidente da Fiocruz durante o antigo (des) governo e primeira mulher à frente do Ministério da Saúde, Nísia Trindade acumula uma série de legados. É mestre em Ciência Política, doutora em Sociologia e possui a sensibilidade de entender que saúde não deve ser pensada apenas pela ótica flexneriana a partir do processo saúde doença. Somos mais do que nossos corpos fisiológicos.

 

Não obstante, para membros do Centrão e pessoas com o pensamento retrógrado, mulheres como Nísia, que ocupam cargos altos, precisam ser “brutas” ou “falar grosso” quando estão em espaços que ainda são dominados por eles – homens, cis, brancos e com pesos diferentes na bagagem que lhes facilitam o trajeto.

 

Durante esta semana Nísia foi atacada, mas não com as mesmas flores que lhe deram no Dia Internacional das Mulheres. Teve sua capacidade técnica e política questionadas porque não falou “grosso o suficiente”, como se para ocupar espaços privilegiados ela precisasse ser deselegante ou provar que merecesse posição de destaque à base do grito, a despeito do vasto currículo e experiências que a precedem em suas vivências profissionais.

 

Pressionada por aqueles que calam mulheres no grito, Nísia se manteve tão firme como quando esteve em sua gestão à frente da Fiocruz durante a pandemia: “fogo, para mim, nunca é amigo”, destacou a titular da Pasta que concentra a maior riqueza de recursos em emendas parlamentares, com R$ 22,1 bilhões dos R$ 47,6 bilhões reservados no Orçamento de 2024 para indicações individuais, de bancadas ou de comissões do Congresso Nacional.

 

Isso me fez lembrar o declínio político da ex-presidente Dilma Roussef durante, o golpe perpetrado pelo mesmo Centrão que achaca Nísia Trindade por seu protagonismo técnico e político em meio às emergências de saúde pública que o país enfrenta. Que nós, homens, passemos a olhar mais cautelosamente antes de questionar qualquer mulher em cargo de destaque: elas abdicaram e abdicam de muito para ocupar posições relevantes para o país. Elas, que são constantemente questionadas, carregam pesos que lhes são socialmente outorgados em contratos que sequer lhes perguntamos se aceitariam ou não.

 

Espero que Nísia Trindade e as futuras e atuais mulheres que, com dificuldade chegaram onde estão, possam trabalhar sem o peso do machismo, da misoginia ou de qualquer contrato social que lhes tire o poder de serem quem quiser ser.

 

Enquanto continuarem tendo seu espaço de fala e de existência questionados, precisaremos relembrar o óbvio: lugar da mulher é onde ela quiser estar.

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