Os programas de partidos diferem dos programas de governo principalmente pelo caráter predominantemente conjuntural, de composição política mais diversa e pelas limitações temporais desses últimos. Um programa de governo para ser levado a sério tanto pelos eleitores como pelo próprio governo, em caso de vitória eleitoral, precisa ser antes de tudo realista política, econômica e administrativamente. Levar em conta legados, acertos e erros do passado sem, contudo, deixar de considerar as novas características da realidade presente e um mínimo de previsão de futuro. Em nome da esperança precisa, também, conter alguns elementos de mudanças conjunturais e estruturais que podem ser realizadas integralmente ou, pelo menos, iniciadas pelo novo governo eleito. No caso concreto, o programa de governo Lula-Alckmin, coordenado pelo companheiro Aloisio Mercadante e de cuja elaboração o companheiro Alexandre Navarro, do PSB, e eu participamos juntamente com representantes dos sete partidos que compõem a coligação, tem quatro fontes distintas. A primeira são as Diretrizes previamente aprovadas pelos partidos. Depois as contribuições dos partidos. Temos também as mesas de diálogo e de entidades representativas. E, finalmente, as milhares de contribuições oriundas da plataforma digital aberta para esse fim. Claro que a maior responsabilidade política pela sistematização e pela redação desse grande manancial ficou, naturalmente, com a Fundação Perseu Abramo, do PT, partido do candidato a presidente. Entretanto, o PSB passou às mãos do coordenador do programa, um documento intitulado Contribuições do PSB ao Programa de Governo Lula-Alckmin, no qual estão algumas ideias já defendidas na Comissão dos Partidos e outras que consideramos relevantes para o futuro governo. Ideias que foram também apresentadas pelo presidente Carlos Siqueira na Convenção do que formalizou a coligação PT e PSB com a chapa composta por Lula e Geraldo Alckmin. Independentemente de serem inteiramente absorvidas no programa de governo, entendemos que era nossa obrigação apresentar, de forma um pouco mais conceitual, a visão socialista sobre um governo democrático.
As propostas contidas nas Contribuições foram todas extraídas do Programa aprovado por unanimidade por ocasião do XV Congresso Nacional da Autorreforma do PSB. Mas não se constituem numa reprodução do Programa partidário. Levam em conta as características políticas de “um governo de reconstrução nacional e resgate da democracia plena, composto por ampla frente democrática que deverá considerar as expectativas da pluralidade política que certamente marcará sua composição“. Apresentamos em primeiro lugar uma premissa que entendemos ser de bom alvitre adotá-la de forma transversal em todo o programa: a criatividade. Ainda que inerente a toda a atividade humana e responsável pelos grandes avanços da história, a criatividade se revestiu de importância muito especial com a revolução tecnológica. Tornou-se a mola propulsora do novo paradigma econômico e social da era do conhecimento, ou sociedade em rede como diz Manuel Castells. O programa atual do PSB tem um capítulo introdutório denominado “Brasil Potencia Criativa e Sustentável”.
Leia também: Carlos Siqueira: ‘PSB preza pela autonomia de escolher seus candidatos’ Em seguida propomos algumas reformas estruturais, exatamente o que nos faltou em nossos governos de 2002 a 20016. Sabemos que o compromisso fundamental do futuro governo Lula-Alckmin é com a restauração democrática e que sua composição deverá corresponder à uma ampla pluralidade que nos imporá alguns limites. Vemos, contudo, a necessidade de indicar à Nação a perspectiva de reformas sem as quais avançaremos pouco no aprofundamento da nossa democracia. Começamos com a Reforma Política. Depois sugerimos a Reforma Tributária. Reafirmamos o compromisso já assumido com uma nova Reforma Trabalhista. E propomos também que seja iniciada uma Reforma do próprio Estado brasileiro. Defendemos, no documento, um novo modelo de desenvolvimento que tenha com eixo central a inovação e a economia criativa capaz de pavimentar o caminho do Brasil para a modernidade com processos produtivos sofisticados tecnologicamente. Para isso propomos que um Planejamento Estratégico capaz de articular o empresariado, as universidades, os institutos de pesquisa, os trabalhadores, o mundo da cultura, seja gerido por um órgão transversal e interministerial. Como ponto central da política industrial entendemos que uma nova indústria baseada na inovação tecnológica, no design nacional, na pesquisa cientifica e nos recursos da inteligência artificial seria fruto de um verdadeiro renascimento criativo da indústria. E como parte desse processo defendemos transformar a Amazônia num dos maiores, senão o maior diferencial competitivo do Brasil no plano internacional. Garantindo a floresta em pé e os rios fluindo, implantar um grande projeto de desenvolvimento a partir das novas tecnologias e do avanço das pesquisas da bioeconomia, da bioengenharia e da biotecnologia. Articulando o grande acervo já existente na Amazônia das universidades e dos institutos de pesquisa e dos saberes populares das comunidades indígenas, o Estado brasileiro deve liderar uma iniciativa de grande porte a exemplo do que foi a Petrobrás, a Embrapa e a Eletrobrás. Uma empresa estatal de capital misto com características mais cientificas e tecnológicas, mas com capacidade financeira para ter participação e incentivar empresas privadas, startups amazônicas e brasileiras. Pensamos na criação da AMAZOMBRÁS como uma “holding” tecnológica e financeira com dimensão global. O documento Contribuições lembra ainda da necessidade de instituirmos um programa nacional de apoio às Cidades Criativas que contemple a formação de Consórcios Intermunicipais Criativos. Na área de educação destacamos a necessidade de perseguir o objetivo de ampliar o número de escolas em tempo integral, o fortalecimento de políticas de permanência, a manutenção das cotas étnico-raciais e para pessoas com deficiência e como objetivo de médio prazo o ensino totalmente gratuito e de boa qualidade para todas as crianças brasileiras. Na área de Segurança Alimentar defendemos um programa baseado na agricultura familiar e na agroecologia urbana, semelhante ao programa desenvolvido no estado do Maranhão. Finalmente sugerimos como bandeira de campanha e programa de governo, o Direito a Felicidade, conforme a definição da ONU como premissa de que o objetivo de uma sociedade justa não pode ser apenas o crescimento econômico. Mas a integração do desenvolvimento material com o cultural, o psicológico, espiritual e ambiental.
Comments